A proteína GFP
(green fluorescent protein) é uma velha conhecida dos biólogos. Em 1994 ela foi
isolada pela primeira vez da água-viva Aequoria
victoria, animal que apresenta propriedades bioluminiscentes. Quase 20 anos
depois da descoberta, a GFP é largamente utilizada como um marcador para
determinar a expressão de genes em nível celular. Em 2008 os cientistas
envolvidos no estudo ganharam o Prêmio Nobel de Química.
Nada mais justo.
Abaixo coloquei uma figura
que ilustra uma aplicação desta técnica no estudo da expressão da proteína RAS em bichos-da-seda. Neste
caso, a GFP foi fusionada com os três tipos de proteína RAS encontradas e as
partes em verde indicam em quais pontos da célula houve a expressão de RAS.
A - controle para expressão de GFP. B,C,D - expressão das variantes da proteína RAS que foram fusionadas a GFP |
Você deve estar se
perguntando: tá, e o que tem a ver a coelha com a água-viva?! Tudo, oras!
O Eduardo utilizou essas
informações para criar a Alba, em parceria com a pesquisadora Louis-Marie Houdebine, do National Institute of Agronomic Research na
França. Isso tudo aconteceu no ano de 2000.
A foto acima é a única disponível na internet |
O artista explica em seu site alguns
aspectos sobre a sua “obra”. Eduardo diz que a coelha é albina - e, portanto,
não apresenta pigmentos na pele – e que só brilha quando iluminada com a luz
certa - neste caso é uma luz azul com comprimento de onda de no máximo 488nm.
Ele também fala que utilizou uma forma melhorada da GFP, a EGFP, pois a última
apresenta melhor fluorescência do que a proteína do tipo nativo.
Foi então que a discussão
ética se iniciou. Eduardo nunca pode retirar a coelha do laboratório e expô-la
ao público, muito menos realizar ser sonho de levá-la para casa e tê-la como
seu pet.
Nesta reportagem da Wired, publicada em 2002, a morte de Alba é
anunciada e segue a declaração de Houdebine sobre o ocorrido:
"I was informed one day that bunny was dead
without any reason. So, rabbits die often. It was about 4 years old, which is a
normal lifespan in our facilities." (Um
dia fui informada que a coelha tinha morrido por nenhuma causa aparente. Coelhos morrem frequentemente. Ela tinha
quatro anos, que é uma expectativa de vida normal em nossos laboratórios.)
Quem sabe matemática básica
percebe a incoerência dos fatos. Se Alba nasceu em 2000, como ela tinha quatro
anos em 2002? E eis outra polêmica.
Kac alega na reportagem que havia
um acordo entre ele e a pesquisadora que permitia a retirada da coelha dos
laboratórios. Culpa do diretor do Instituto que não deixou, segundo Houdebine.
A reportagem também discute a veracidade das fotos tiradas por Kac. Para o pesquisador ReinhardNestelbacher, seria impossível obter aquela imagem, uma vez que o GFP só se
expressa na pele – e não nos pelos, como sugerido pela foto. Eduardo explica
que utilizou uma luz especial para a foto de Alba – e que a foto é sim verdadeira.
Em outras fotos disponíveis nesta
página da National Geographic “Glowing Animals: Beasts Shining for Science” (o título em si já é uma discussão ao
tema!!!) é possível ver animais que contém GFP e que exibem a fluorescência em
áreas onde o pelo é curto ou inexistente. Ponto para Nestelbacher.
macaco Rhesus |
camundonguinhos glow-in-the-dark |
O fato é que nunca saberemos
as respostas a essas dúvidas sobre Alba. O que está ao nosso alcance é fazer uma reflexão
sobre as implicações éticas e morais de pesquisas que envolvem manipulação de
seres vivos. Não entendo muito bem porque pouco se comenta quando uma placa de
Petri contém bactérias fluorescentes, mas há toda uma mobilização social quando
um camundongo glow-in-the-dark aparece na TV.
Eu não acharia ruim ter um
animal fluorescente em casa. Embora de origem sintética, as camisetas, chinelos
e afins já estão aí. Só falta um toque de GFP para elas ganharem mais vida.
Continuo com o Genesis, na
semana que vem.
Deixo vocês com um trecho escrito por Kac – e que traduzi para o blog - ,disponível em inglês neste endereço.
“[...] A arte pode ser também de grande valor
social. Como o domínio da arte é simbólico – mesmo quando intervém diretamente
em um dado contexto -, a arte pode contribuir para revelar as implicações
culturais da revolução que está por vir e oferece diversas maneiras de pensar
sobre e com a biotecnologia. [...] A arte transgênica pode ajudar a ciência a
reconhecer o papel de questões sobre a relação e comunicação no desenvolvimento
de organismos. Pode ajudar a cultura ao desmascarar o credo popular de que o
DNA é a ‘molécula chave’ que influencia o organismo como um todo e ambiente
(contexto). Por último, a arte transgênica pode contribuir no campo da estética
ao abrir novas dimensões pragmáticas e simbólicas da arte como a criação
literal e tendo reponsabilidade pela vida.”
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